Os oceanos de Encélado e uma pitada de Plutão
A notícia da semana vem de Saturno, mais precisamente da sua lua Encélado. Encélado é a sexta maior lua do planeta dos anéis e foi descoberta pelo astrônomo inglês William Herschel em 1789, o descobridor do planeta Urano, quando ele usou pela primeira vez seu telescópio de 1,2 metros de diâmetro, que na época era o maior do mundo.
Com apenas 500 km de diâmetro, Encélado só se tornou interessante com a passagem da duas sondas Voyager no começo dos anos 1980. Até então não passava de um pontinho de luz, difícil de se ver, dado que o brilho de Saturno e seus anéis atrapalha bastante. Mas assim que as sondas passaram por perto e mandaram imagens de sua superfície, ficou claro que essa minúscula lua era tão interessante quanto sua irmã gigante Titã.
A superfície de Encélado tem poucas crateras, indicando que ela é muito recente. Os impactos foram sendo apagados ao longo do tempo. Mais ainda, fraturas e rachaduras em sua superfície denunciam que há um processo de tectonismo ativo fazendo com que essas estruturas apareçam e que sua superfície esteja sempre sendo renovada. Mas o que causaria esse tipo de atividade, já que com apenas 500 km de tamanho, não há como Encélado ser geologicamente ativo?
A resposta é a mesma de Europa, uma das luas de Júpiter, água!
Podemos fazer uma comparação com o tectonismo da Terra da seguinte maneira. No nosso planeta, os continentes e as placas tectônicas se movimentam sobre um fluido, o magma. Em Europa, ao invés de placas geológicas, temos grandes massas de gelo que flutuam, não sobre lava, mas sobre água. Os movimentos dessas placas podem produzir as rachaduras, ou fraturas, vistas na superfície da lua. A mesma teoria poderia se aplicar para Encélado, já que essas estruturas existem do mesmo jeito em sua superfície.
A hipótese de um oceano começou a ganhar força quando a sonda Cassini flagrou plumas de vapor escapando do polo sul de Encélado. As imagens mostravam que aproximadamente 250 kg de água são jogados para o espaço a cada segundo a uma velocidade de quase 2.200 km/h! A Cassini também conseguiu “experimentar” as partículas ejetadas e descobriu que além de salgadas, elas continham material orgânico simples. Dois indicativos da existência de um oceano interior.
A grande questão era saber se o oceano se restringiria a um grande mar no polo sul apenas, de onde partem as plumas detectadas, ou se seria um oceano global, envolvendo toda a lua. A resposta, de acordo com um artigo publicado na revista Icarus nessa semana é que debaixo da crosta de gelo, cada centímetro quadrado de Encélado está banhado em um oceano salgado. A equipe liderada por Peter Thomas, da Universidade de Cornell (EUA) usou imagens da pequena lua e as medidas de seu movimento ao redor de Saturno. A aceleração e a desaceleração de Encélado, conforme ela percorre sua órbita, bem como as pequenas variações da medida da gravidade da pequena lua, detectadas pela sonda Cassini foram usadas para se obter essa conclusão. Simulações em computador usando diversas estruturas para o interior da lua mostraram que o melhor modelo que reproduzia os movimentos medidos pela sonda Cassini era o que continha um oceano de 20-40 km de espessura, abaixo de uma crosta de 10 km de gelo.
A descoberta atiça ainda mais a curiosidade dos astrobiólogos, já que o potencial para haver vida microbiana simples é muito grande, assim como Europa. Entre 2006 e 2015 nada menos que 11 missões de estudo de Encélado foram propostas, mas até agora nenhuma saiu do papel. Quem sabe agora alguma delas ganhe algum dinheiro para prosseguir. Enquanto isso, a Cassini deve ainda fazer mais 3 sobrevoos até o final do ano, sendo que na penúltima delas, dia 28 de outubro, a sonda deve passar a meros 49 km de sua superfície. Podemos esperar imagens fantásticas!
Mais Plutão!
Por falar em imagens fantásticas, olha só essa aqui, que foi liberada nessa quinta feira (17). O download das imagens de alta resolução obtidas pela New Horizons continua e cada imagem que chega, o queixo cai ainda mais.
Ela foi obtida 15 minutos após a máxima aproximação da sonda com Plutão, a uma distância de 18 mil km de sua superfície, na fase que ela olhou para trás para usar a luz do Sol distante para investigar a atmosfera do planeta anão. E olha só a estrutura dela sobre a superfície! Essa estratificação, que mostra neblina mais perto do solo, é um indicativo de que há alterações atmosféricas semelhantes às que acontecem na Terra, como a formação de nuvens mais baixas.
Além disso, as imagens mostram que o nitrogênio passa por um ciclo semelhante ao que vemos acontecer com a água no nosso planeta. No caso de Plutão, o nitrogênio vai à atmosfera, se condensa em flocos de neve e cai sobre a superfície. Ainda que não se torne líquido, ele deve formar um fluido espesso e escorre das regiões mais altas para as mais baixas, formando as planícies congeladas que vemos.
Mas a despeito de tudo isso, o que mais me impressiona nessa imagem é a paisagem, como as sombras se projetam das montanhas de gelo. No alto, perto do horizonte está a cadeia de montanhas Hillary com seus majestosos 3.500 m de altura, enquanto que em primeiro plano estão as montanhas Norgay. Semana que vem tem mais!
Créditos.
Encélado: NASA/ESA/CASSINI/Ciclops
Plutão: NASA/APL-JHU/SwRI