A imprensa em nível estadual noticiou recentemente que foi gasto mais de R$ 700 mil num projeto de urbanização de um trecho de 1.800 m² batizado “Calçadão Cultural Beira Rio”, que acomoda além de restaurantes, um palco para apresentações artísticas. Os recurso foram provenientes de uma emenda parlamentar do deputado federal Assis Carvalho (PT), com o restante como contrapartida da Prefeitura de Parnaíba, sob o comando do prefeito Florentino Neto (PT). Para se ter uma noção, o grande ‘gasto’ do calçadão foi preparar a estrutura para receber a calçada propriamente dita.
Segundo a matéria “a estrutura, simples até, consumiu dinheiro público além do que normalmente vale. Na Nova Potycabana, em Teresina, por exemplo, que tem seu piso semelhante ao do Calçadão, foram gastos R$ 5,5 milhões na obra, que é muito mais complexa, equivalente a R$ 127 por m². Já em Parnaíba, a obra de 1.800 m² e de R$ 720 mil, teve um custo de R$ 400 por m². Quer dizer, se o Assis Carvalho e o Florentino Neto fossem construir a Potycabana gastariam R$ 17,2 milhões na obra, mais de três mais caro do eu realmente custou”. (Confira a matéria: http://180graus.com/noticias/parnaiba-constroi-calcada-mais-cara-do-pi-custa-mais-que-a-potycabana).
Houve aqui mal gasto do dinheiro público? O que leva o poder público a mal gastar o dinheiro? A falta de zelo está alinhada a outra qualidade humana negativa? Há indícios de corrupção?
Antes há de se compreender que a corrupção não é só política e nem sempre envolve dinheiro. Existem três formas de se corromper: pelo abuso, pela omissão ou pelo desvio. Corrupção (do latim: Corruptus – “despedaçado”, ou em uma segunda acepção, “pútrido”) é o ato de se corromper, ou seja, obter vantagem indevida, seja por ação ou omissão, observando-se a satisfação de benefício próprio, a despeito do bem comum. Embora não se atribua a este ou aquele que tenha levado vantagem financeira com desvio do recurso público, muito há o que se explicar pelos valores aplicados nesta obra!
A importância dela não se discute, mas tampouco como ela foi administrada! Essa cultura de mal gastar o dinheiro público se mantém graças a cultura da omissão da sociedade. Ninguém diz nada, ninguém fiscaliza. E quando se quer respostas a casos como este, é tratado como “invejoso” e “traumatizado”!
A corrupção na política é o reflexo de uma cultura já enraizada de pequenos e permissivos deslizes, afirma a especialista em corrupção e patologia social da PUC-SP, Denise Ramos. Provavelmente ninguém para pra pensar o quanto afeta na sociedade essa mentalidade anômica, dessa carência de preceitos morais e éticos, sempre em busca da vantagem própria. É a “Lei de Gérson” aplicada, talvez uma frase infeliz do ex-jogador para o momento, mas que reflete em totalidade como funciona a política no Brasil, até porque fazer política não é exclusividade parlamentar, mas um dever de todo cidadão, segundo disposto no parágrafo único do Artigo 1º da Constituição Federal: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Precisamos todos “fazer política”!
Os efeitos deletérios da corrupção e da má gestão não são traduzidos tão-só monetariamente. Vidas humanas são sacrificadas quando há desvios de recursos públicos. A corrupção política e a má gestão dos governos são vistas como algumas das principais barreiras ao crescimento e desenvolvimento econômico.
A corrupção e a má qualidade dos governos reduzem a oferta e a qualidade de bens e serviços públicos. Desvios de recursos em educação, saúde, coleta de lixo e obras, por exemplo, geram altos custos para a sociedade já que reduzem a acumulação de capital humano e acentuam a desigualdade porque domicílios mais pobres dependem de maneira mais acentuada dos serviços públicos. São exemplos de prejuízos imensuráveis causados pela administração inapta.
O controle da atividade administrativa fica a cargo do Poder Legislativo, através da Câmara de Vereadores, com o auxílio do Tribunal de Contas Estadual, além do Controle Jurisdicional efetivado pelo Poder Judiciário mediante provocações (conforme art. 2º do CPC) e com incidência direta sobre a legalidade administrativa, coibindo os atos ilegais e o abuso de poder. Além desses, pode-se citar ainda a brilhante atuação do Ministério Público que mesmo não havendo, a rigor, um Controle Ministerial da atividade administrativa - vez que sua atuação consiste em demandar perante o Poder Judiciário, acionando o órgão judicante por meio da Ação Civil Pública para que, este sim, exerça seu controle - vem desempenhando uma importante tarefa no combate a improbidade administrativa.
É visível que o principal órgão público de controle, a Câmara Municipal, se mostra impotente no embate contra a má gestão, pois os entes desse poder, quase unânime, estão politicamente atrelados ao prefeito, ou seja, a quem deveriam controlar. Por isso, cada cidadão ou grupo de cidadãos, isoladamente ou em conjunto com entidades ou organizações da sociedade civil, pode ser fiscal das contas públicas. Cada um desses atores sociais pode, por exemplo, verificar se a obra do Calçadão Cultural foi realizada conforme previsto ou se os valores das notas fiscais são compatíveis com os preços de mercado. Contudo, há de estar preparado para ser mal interpretado!
(*) Fernando Gomes, sociólogo, eleitor, cidadão e contribuinte parnaibano.
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