O tema educação é intrigante, delicado e revelador. Lamentavelmente não permeia a realidade da prioridade entre as políticas das esferas do poder público em nenhum dos seus níveis (municipal, estadual e federal), por quê? A quem interessa que a escola pública não tenha qualidade? Que rumo seguir?!
Um dos educadores mais respeitados do Brasil, Paulo Freire, costumava afirmar que "ensinar o povo a ver criticamente o mundo é sempre uma prática incômoda para os que fundam os seus poderes sobre a inocência dos explorados". A realidade das nossas escolas municipais, embasa a opinião famosa de Freire.
O projeto de poder político em curso há décadas em Parnaíba não trata a educação como prioridade em suas ações e programas. Apesar de aparecer em destaque no Programa de Governo oficial, o município ainda não conseguiu traduzir essa intenção em ações efetivas. E isto explica o enorme número de pessoas que sequer possui educação primária em Parnaíba, sendo ainda grande o número de pessoas que possui poucos anos de escolaridade. A pirâmide educacional acompanha muito de perto a pirâmide da distribuição da renda e da riqueza. Os mais pobres são os menos escolarizados!
A gestão garante, em seus discursos, o acesso de seus cidadãos à educação básica. Afinal, a educação escolar é uma dimensão fundante da cidadania, e tal princípio é indispensável para políticas que visam à participação de todos nos espaços sociais e políticos e, mesmo, para reinserção no mundo profissional. Porém, na prática, frequentemente, são noticiadas situações de escolas que estão quase caindo na cabeça dos alunos, falta de carteiras escolares, transporte escolar irregular ameaçado pela falta de pagamento dos contratos e professores mal remunerados. Muitas escolas nem ao menos possuem biblioteca!
Dois exemplos de descaso da gestão: Escola Municipal Marielisie Mourão (João XXIII), onde há muito necessitava de uma reforma, este ano a prefeitura transferiu os alunos para duas casas alugadas no próprio bairro, começaram a mexer no teto e as obras estão paralisadas; Escola Municipal Henriette Soter C. Branco (bairro Piauí), sem vigia, roubam lâmpadas e a noite as aulas são suspensas, estrutura física comprometida, parte do telhado em descoberto, carteiras inadequadas..., puro descaso!
Assim caminha nossa humanidade, com o ensino de faz de conta, escolas sem condições mínimas de dignidade e um futuro cada vez mais incerto. Mas, enquanto a educação sucumbe, a Prefeitura oferece, e o povo, inculto e incauto, aceita de bom grado: a aprovação automática e os analfabetos funcionais, enfim, a mediocridade ampla, geral e irrestrita, que só interessa ao projeto de poder e seus beneficiários.
O gestor precisa compreender que o acesso à educação é também um meio de abertura que dá ao indivíduo uma chave de autoconstrução e de se reconhecer como capaz de fazer suas próprias opções. Com instrução, pode o indivíduo galgar um espaço que lhe permita um trabalho digno e, tendo instrução e trabalho pode quebrar as correntes da dependência a quem quer que seja. O direito à educação, nesta medida, é uma oportunidade de crescimento cidadão, um caminho de opções diferenciadas e uma chave de crescente estima de si. Informado e consciente o indivíduo não cairia nas armadilhas da politicagem!
Uma sociedade com nível de educação elevado facilitaria a gestão. No entanto, opta-se por manipular a opinião e realizar pequenas obras que demonstrem e justifiquem um modelo de gerenciamento que não cuida da essência de sua missão: promover o bem estar social!
Essas questões foram abordadas há 270 anos por David Hume em obra considerada clássica (Um Tratado da Natureza Humana). Hume estava intrigado com "a facilidade com que os muitos são governados pelos poucos e a submissão implícita com que os homens cedem os seus destinos aos seus governantes". Achava tal fato surpreendente, pois "a força sempre está do lado dos governados". Se as pessoas se dessem conta disso, sublevar-se-iam e derrubariam seus governantes. Chegou à conclusão de que o governo está baseado no controle de opinião, um princípio que "se estende aos governos mais déspotas e à maioria dos governos militares, bem como aos mais livres e mais populares". O gestor conta ainda com dois aspectos que lhe são favoráveis: povo de memória curta e história de gestões anteriores mais medíocres.
Mas sabemos que o progresso de um povo depende do sucesso da educação. Já a boa educação depende de bons mestres. E não só de bons salários vive um bom professor. Ele precisa também de qualificação, de estímulos. Ele merece respeito, dignidade, reconhecimento. Parnaíba não valoriza seus professores porque não se preocupa com o amanhã.
Em nosso meio, uma triste realidade social concorre para que a escola tenha pouca qualidade: a maioria das pessoas não se importam se o ambiente escolar educa ou não as crianças. Para estes, basta depositar os filhos na escola. Para o filho, basta passar de ano, mesmo que didaticamente reprovado. Para o município basta as estatísticas, o conhecimento é apenas um mero detalhe.
Mas nem sempre dar escola não é dar educação. Então, pra que serve o conhecimento? Pra quê abrir mentes? Fazer-nos pensar? Aos poderosos, não interessa um povo culto. Afinal, quem pensa por si mesmo não se deixa manobrar. Talvez uma medida revolucionária transformasse esta realidade cruel: a obrigatoriedade dos filhos do prefeito, dos vereadores e dos professores estudarem na escola municipal!!!
(*) Fernando Gomes, sociólogo, eleitor, cidadão e contribuinte parnaibano.